O clamor do silêncio
Título: O clamor do silêncio
Dimensões: 76 cm (L) x 100 cm (A)
Técnica: Óleo sobre tela
“O clamor do silêncio”, pintura da autoria de Malendze, executada em óleo sobre tela no formato vertical com as medidas 75cm x 100cm, é uma obra que se impõe pela força do seu simbolismo e pela profundidade emotiva que projecta. Nesta criação singular Malendze revela, com particular nitidez, a forte herança estética e conceptual do saudoso mestre Malangatana, cuja influência se pressente tanto na intensidade cromática como na densidade humana das figuras representadas.
A tela é dominada por rostos alongados, expressões suspensas entre o medo e a resistência, figuras que jazem, submissas, numa penumbra densa, onde a cor vibra em contrastes dramáticos. Há um tumulto silencioso que percorre a composição — um clamor de dor colectiva, uma angústia antiga que, apesar de não gritar, ecoa. É esta quietude tensa, quase sufocada, que justifica o título da obra: o silêncio imposto aos escravizados de todas as épocas, vítimas de uma injustiça que, desde sempre, se perpetua impune na sombra da prepotência humana, com a cumplicidade do silêncio.
Malendze trabalha cada detalhe como se esculpisse a verdade emocional da cena: os olhos cerrados pelo medo, ou arregalados de dor, que guardam histórias nunca contadas; as formas entrelaçadas, que sugerem solidariedade e vulnerabilidade; e o uso magistral de cores terrosas e vermelhos queimados, que remetem para o fogo interior da luta e da esperança. A influência de Malangatana revela-se na energia expressiva, na intensidade visceral da paleta cromática e na fusão entre o humano, o mítico e o espiritual.
Mas, apesar da dor inscrita nos rostos, a obra não se encerra na denúncia. Pelo contrário: há uma luz subtil que parece emergir do fundo da tela, como se a esperança se insinuasse discretamente por entre as camadas de cor. Esta claridade — tímida, mas persistente — lembra que a Humanidade, mesmo ferida, procura sempre um caminho para renascer.
“O clamor do silêncio” é, assim, mais do que uma pintura: é o ruído de um manifesto silencioso contra uma opressão cuja origem se perde na noite dos tempos, comandada pela lei do mais forte num mundo de caos imposto pelos Leviatãs que, da tibieza das sociedades, emergem em cada época. É um retrato da dignidade ferida e, ao mesmo tempo, um apelo ao renascimento de um Mundo melhor, onde a justiça possa prevalecer sobre a força bruta, e onde a voz dos vulneráveis não seja silenciada.
Malendze oferece uma obra profundamente humana, pungente e luminosa, que, homenageando Malangatana, honra a tradição artística de Moçambique e afirma, com clareza, o seu próprio lugar no panorama das artes plásticas contemporâneas.

O artista
O artista plástico moçambicano Alberto Malendze, conhecido no meio das artes plásticas simplesmente como Malendze, é um daqueles criadores raros cuja obra parece nascer directamente do sopro invisível que percorre Moçambique — do rumor sibilante das frondosas casuarinas, do murmúrio das urbes, do silêncio sagrado das tradições. As suas telas, trabalhadas em óleo e acrílico, são muito mais do que meras superfícies pintadas: são espaços onde a cor respira, onde a luz se demora, onde a alma encontra eco.
Em Malendze, cada tonalidade vibra com a intensidade de um poema. Os seus dégradés profundos, ora quentes como o entardecer em Inhambane, ora serenos como um amanhecer sobre o Índico, compõem uma linguagem sensorial única. A cor transforma-se em narrativa, em memória, em presença — como se a tela guardasse dentro de si o som distante de vozes, de passos, de histórias que resistem ao tempo.
O traço de Malendze é intuitivo, mas nunca desordenado. Há nele uma musicalidade íntimista, um ritmo que nos conduz para dentro das formas e das figuras, como se estivéssemos a seguir o pulsar de um coração antigo.
As figuras humanas — frequentemente centrais no seu universo — surgem como aparições luminosas: não representam apenas pessoas, mas estados de espírito, fragmentos de identidade, sombras de um povo que se reconhece na sua própria poesia visual. São corpos que carregam o peso suave da tradição, mas que se movem com a liberdade de quem habita o espaço contemporâneo universal.
Há um silêncio particular na obra de Malendze — um silêncio fértil, cheio de ressonâncias. É o silêncio das povoações ao anoitecer, das conversas murmuradas, da ancestralidade que nunca se diz por completo. Esse silêncio é o espaço onde a imaginação do observador se instala, onde cada tela se transforma num diálogo íntimo entre o artista e quem a contempla.
As obras de Malendze não procuram deslumbrar apenas pela técnica, embora esta seja notável. Procuram, outrossim, tocar, evocar, comover. Cada pincelada parece oferecer uma passagem para outro lugar — não geográfico, mas interior. E quem se detém diante de uma obra do artista encontra quase sempre uma espécie de reconhecimento: como se aquilo que se vê tivesse sido, de alguma forma, sempre nosso.
No panorama artístico moçambicano, Malendze destaca-se como um verdadeiro poeta universal, um mestre da cor e da forma. As suas telas são cânticos silenciosos, celebrações do que somos e do que desejamos ser, pequenos milagres de luz e de sensibilidade criados para perdurar.
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